Fato-relevante anuncia nova venda de ações com direito a voto por decisão do governador Eduardo Leite. Controle acionário do estado ficará ancorado em uma única ação
Depois de dizer umas coisas e fazer outras, tantas vezes entre ser candidato a governador e atuar como governador, Eduardo Leite deu mais uma cartada na direção de sua política de austeridade e privatização do patrimônio público. Não podemos nos enganar, porque a gente já sabe qual é o modus operandi do governador: dizer que não vai fazer o que criticou o antecessor e fazer o mesmo ou pior. Pois dessa vez (ou de novo) ele volta a atacar o Banrisul. Leite anunciou, na quarta-feira, 12/6, que vai vender todas as ações até o “limite da manutenção do controle acionário” do Estado. A outra venda que ele realizou ocorreu em abril passado.
É claro que o governador não disse isso diretamente até tentou dizer que não é bem isso numa nota oficial (leia no fim da matéria) Mas a gente sabe que ele não assume bem as decisões que toma. Quando ele acha que a notícia não será boa para sua imagem de pessoa jovem e de ideias novas, mas que faz práticas da velha política de austeridade, como seus antecessores, José Ivo Sartori e Yeda Crusius, ele deixa a bronca para os outros. Nessa caso, para o Banrisul.
Por isso coube ao banco, por meio de fato-relevante, publicado na manhã da quarta, 12/6, fazer o serviço que o governador Leite não faz sozinho: anunciar a entrega das ações “excedentes de controle”. Já tem gente do mercado dizendo que a oferta pública de venda de ações pode render cerca de R$ 2 bilhões.
Segundo especialistas são papéis ON, com direito a voto. O volume de oferta será de entregar todos esses papéis com direito a voto, ou seja, 50% do que estão na mão do governo do Estado, que tem o controle acionário do Banrisul, menos uma ação. Quer dizer, Leite vai fazer um “jogo de resta um” com os gaúchos. Além de entregar quase tudo para arrecadar cerca de R$ 2,3 bilhões, o Banrisul ficará na beira de um abismo perigoso. Apenas uma ação ON vai separar o controle do Estado do mando do mercado.
Fragilização do Banrisul
O presidente do SindBancários, Everton Gimenis, diz que essa operação, ainda sem data para ser realizada, praticamente avança a entrega do Banrisul, porque fragiliza a controle acionário público. “O Banrisul vai ficar a uma ação de perder o controle acionário do Estado. É mais uma operação prejudicial à soberania do Banrisul. Isso porque o Estado passa a praticamente não ter mais controle sobre as estratégias do banco. Se o mercado quiser praticar juros altos e passar a pensar o Banrisul como um banco sem visão social, os novos acionistas poderão colocar essas questões no Conselho Administrativo e até aprová-las”, alertou Gimenis.
Sem contar que a entrega desse valor ou desse volume de ações com direito a voto reduz os dividendos repassados a partir do lucro do Banrisul para investimento público ao Estado. Um Estado quebrado vai ter menos capacidade de investimento ainda do que já tem. E, mais uma vez, não é mais dono nem vai receber todos os ovos da galinha dos ovos de ouro. Está a uma ação de entregar a maior parte dos ovos de ouro para operadores do mercado, para banqueiros privados, ou entregar de vez a gestão da galinha dos ovos de ouro a quem não tem interesse público.
“Onde passa o boi, passa a boiada”
Faz muito sentido o que o presidente do SindBancários pondera quando pensamos no histórico recente e que revela como o governador Eduardo Leite vê o Banrisul e as empresas públicas. Ele já acabou com a obrigatoriedade de plebiscito para vender empresas públicas, como a CEEE, a Sulgás e a CRM, com o auxílio luxuoso da Assembleia Legislativa, e agora dá mais uma forte mordida no Banrisul. “Onde passa o boi, passa a boiada”, tem repetido o presidente do SindBancários, Everton Gimenis, sobre a aceleração das privatizações do setor elétrico e o que vem por aí em relação ao Banrisul.
O problema é que Leite tem sido pego no contrapé. Durante a eleição, ele disse que não venderia o Banrisul. Mas indicou como presidente do banco, o carioca Cláudio Coutinho, um homem de mercado que chegou a ser sócio de empresa especializada em venda de patrimônio público. E, depois de quatro sessões de resistência na Assembleia Legislativa, Leite conseguiu aprovar os nomes dos seus sonhos para a presidência e para outros cargos de diretoria com aumentos de salários que variaram de 74,5% a 80%. O salário do presidente passou de R$ 51 mil para R$ 89 mil. Salário definido pelo governador do Estado.
Pendurado em 23 pila no jogo de resta um
Leite chegou a tirar o seu corpo fora, tendo atribuído o aumento a um comitê do Conselho de Administração do Banrisul. Diga-se que o comitê foi indicado pelo governador. Como se não bastasse, na eleição, Leite foi veemente ao dizer que não venderia o Banrisul. Mas fica com um papel na mão, um frágil papel em forma de uma única ação ON, que na B3 será vendida a qualquer momento como BRSR6. Essa ação fechou na terça-feira, 11/6, com valor unitário de 23,17.
Se, na teoria e na promessa, o governador Eduardo Leite é um homem sério que quer o melhor para os Banrisulenses, para o desenvolvimento econômico do Estado e para o povo gaúcho, na prática ele está jogando aquele antigo jogo de resta um. Vai entregar tudo e ficar com um papel de pouco mais 23 pila na mão. Pode ficar pendurado por um papel. Porque o maior mico será vender o Banrisul.
Investimento nada, custeio
Leite não admite o óbvio. Nunca irá admitir. Tem o ego dos candidatos infalíveis e o espelho do ungido que jamais erra. Como agora ao tentar buscar “no mercado” com “ações excedentes” do Banrisul cerca de R$ 2,3 bilhões.
E, se na eleição ele dizia que não usaria no custeio e que o seu adversário, José Ivo Sartori, havia feito isso de forma “criminosa”, ele já admite fazer a mesma e velha prática. Então, podemos dizer que o que ele nega passa admitir mais adiante, mas sem dizer: privatizar o Banrisul aos poucos, depenando, atacando a imagem de banco sólido e que bateu recordes sucessivos de lucro líquido passando de R1 bilhão no ano passado.
O valor que pretende arrecadar com essa semientrega do banco paga pouco mais do que uma folha de pagamento dos funcionários públicos do Estado. Para quem dizia nas eleições que iria criar um fundo de investimento com esse dinheiro, admitir que não vai fazer o que cumpriu deixa de soar como honestidade. Passa, no mínimo, a ser entendida promessa não cumprida ou falta com a verdade. Governador, nós já sabíamos!
Leia abaixo o Fato-relevante publicado pelo Banrisul
“O Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A. (“Banrisul”), em atendimento à Instrução da Comissão de Valores Mobiliários nº 358, de 3 de janeiro de 2002 e ao Parágrafo 4º do Artigo 157 da Lei nº 6.404 de 15 de dezembro de 1976, comunica aos seus acionistas e ao mercado haver sido informado pelo Estado do Rio Grande do Sul (o “Controlador”) sobre interesse na realização de oferta pública envolvendo ações excedente de controle. A oferta abrangerá ações ordinárias até o limite da manutenção do controle acionário. O Banrisul manterá seus acionistas e o mercado informados sobre quaisquer novos fatos atinentes à matéria em questão.”
Leia abaixo nota da governo do estado sobre a oferta de papéis do Banrisul
“Tendo em vista a autorização do Conselho Diretor do Programa de Reforma do Estado (CODPRE), do último mês de maio, o governo do Estado esclarece que contratou o Banrisul para a coordenação de propostas de eventual colocação do excedente acionário do Banco mediante oferta pública de ações.
Reforça também que não há nenhuma operação aprovada neste momento e que somente estão sendo feitas análises coordenadas pelo Banrisul de uma eventual operação. Nos termos da legislação vigente para companhias abertas (regulada pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM), o Banrisul manterá o mercado formalmente ciente de qualquer avanço. Qualquer iniciativa neste sentido, necessariamente, será objeto de futura deliberação pelo CODPRE.
Como uma possível oferta abrangeria ações ordinárias até o limite da manutenção do controle acionário, o Estado reafirma a manutenção do controle público do Banrisul.”
Fonte: Imprensa SindBancários