Banheiro neutro: uma luta da diversidade

Vidas marcadas pelas discriminações, da mão-leve das autoridades, violências e mortes no mundo Trans

Por Coletivo de Diversidade e Antirracismo do SindBancários

A Lei da Anistia entrou em vigor em 28 de agosto de 1979. No dia 6 de setembro do mesmo ano, encerrava o mais longo exílio de um político brasileiro, o gaúcho Leonel de Moura Brizola (1922-2004). Retornava ao Brasil, 15 anos depois de ter sido obrigado a deixá-lo. Numa entrevista com Brizola, logo depois da volta, o lendário jornalista de Passo Fundo, Tarso de Castro (1941-1991), sapecou uma pergunta tipo saia justa, sobre a posição do Partido Trabalhista em relação ao homossexualismo. “Ele pode provir de uma enfermidade, de uma deformação. Ele (o viciado) foi fraco. Temos que ensejar seu restabelecimento”, afirmou o ex-governador e ex-carbonário gaúcho.

Superar limites

A luta contra as barbaridades ditas pelo político acima é antiga. O feminismo, também é antigo. Segundo historiadores, sua origem remonta aos movimentos sociais que surgiram no período das revoluções Francesa e Americana. No Brasil, o nascimento foi no século XIX, quando surgiram os primeiros núcleos em defesa dos ideais feministas na América Latina. O feminismo não tem nada a ver com ódio aos homens ou estereótipos de “mulher raivosa ou peluda”, como dizem os machistas por aí. Aqui, o movimento estava muito relacionado com a chegada dos ideais anarquistas e socialistas, parte das bagagens dos imigrantes europeus que atracaram nos portos brasileiros em busca de trabalho e uma vida digna.

Divisão bipolar

Na década 1970, as bandeiras do movimento “guei”, se projetavam nas páginas do jornal Lampião da Esquina, a primeira publicação homossexual brasileira, que circulou durante os anos de 1978 e 1981, em plena ditadura militar, onde imperavam a repressão e a censura.

Em 1972, surgiu o Dzi Croquettes, uma trupe de visual extravagante, desvio moral, diziam uns tantos, para outros, androginia e homossexualismo. O grupo unia dança, teatro, música e humor. Pressionados pela ditadura, os artistas revolucionários deixaram o Brasil em 1974, rumo à Europa.

Hoje, o feminismo ganha as ruas com suas próprias bandeiras reivindicatórias, entre elas, a igualdade de gênero, defesa dos direitos LGBT, paridade salarial e liberdade de escolhas da mulher. Lutam, também, pela anulação da divisão bipolar entre homens e mulheres, incentivo à educação sexual nas escolas e tornar a agenda do movimento obrigatória nas mobilizações por melhores salários e melhorias nas condições de trabalho.

Garantia legal

Nossa sociedade reproduz as relações de gênero de um modo muito fixo e binário. Tudo o que é diferente dessa norma causa estranhamento e perseguição. Deslocando este debate para um banheiro, o local vira um espaço de poder e representatividade.
Essa visão cisgêneros (CIS), binária e heterossexual do gênero é referendada em um conjunto de marcadores que vão reforçar ideias de masculinidade e feminilidade. O fato é que, antes de discutir os banheiros, é preciso entender que a nossa cultura é pensada e organizada para homens e mulheres CIS, o que é limitado porque essa ideia não dá conta de toda a pluralidade dos seres humanos.

Os transexuais possuem o direito à igualdade (art. 5º, Constituição Federal), e isso significa que todos os indivíduos têm igual valor e por isso merecem o mesmo respeito e consideração. Acontece que as pessoas transexuais costumam ser subjugadas pela sociedade como inferiores, o que é um absurdo, pois todos possuem os mesmos direitos constitucionais. Isto significa que eles têm a garantia legal de serem socialmente tratados de acordo com a sua identidade de gênero, assim como os demais cidadãos têm esse direito, inclusive, no que se refere ao uso de banheiros de acesso público.

Necessidade urgente

De modo geral, a mulher trans é impedida de usar banheiro feminino na maioria dos lugares públicos. Nesse sentido, a proposta de disponibilizar banheiros Unisex/Multi, visando contemplar a multiplicidade de gêneros e identidades é uma necessidade. Para as pessoas trans, o banheiro também é um espaço de violência. Quando não são identificados nos locais que poderiam frequentar e quando se constata em espaços como o banheiro que as agressões rolam soltas.

Por outro lado, a organização societária não permite que essas pessoas frequentem nenhum lugar ou que não possam estar em nenhum dos dois lugares, banheiro masculino ou feminino, porque não se “adequa” aos padrões do que é lido como homem ou mulher.

Assim, o SindBancários de Porto Alegre, a partir de debates sobre o tema e da construção dos centros acadêmicos, defende a criação de banheiros Unisex/Multi, sem discriminação a pessoas trans, não-binárias ou intersexos. O Sindicato entende a importância de acabar com a violência contra as pessoas que não se enquadram ou não são aceitas em espaços para homens ou mulheres.

Acolhimento e união

Por trás do tema do banheiro, há uma da discussão sobre segregação. É a mesma lógica do bebedouro separado por raça. O que não acontece com os banheiros no interior das casas. Basta uma pergunta: “existe um banheiro masculino e outro feminino nas residências familiares? Nesta medida “esse não lugar comum” expõe o entendimento dos banheiros como um local de livre acesso às pessoas que habitam os mais distintos lares.

Construir políticas públicas, acolhendo e caminhando juntes com as bandeiras da luta, é uma necessidade urgente que não se pode evitar. Os banheiros do SindBancários de Porto Alegre são identificados como Unisex/Multi na perspectiva de ampliação dos espaços de inclusão e de diversidade, de acolhimento e união. É preciso saber viver e avançar nas conquistas, juntes nesta luta que deveria ser de todes.

Rastros da violência

Em junho de 2022, o governo do Distrito Federal orientou as escolas públicas da sua rede de ensino a permitir que estudantes transexuais utilizem os banheiros, conforme sua identidade de gênero. Uma política de avanço para um país onde os dados do levantamento feito pelo Transgender Europe (TGEU) mostram que o Brasil permaneceu pelo 13º ano consecutivo como o país que mais mata pessoas trans no mundo. A cada 10 assassinatos de pessoas trans no mundo, quatro ocorreram no país.

E os números reais devem ser muito maiores, já que não existem dados oficiais sobre assassinatos de membros da comunidade T. Levantamentos como o da TGEU, são realizados a partir das notícias dos casos. Assim, pelo menos 125 travestis, homens e mulheres trans foram assassinadas devido a sua identidade de gênero entre outubro de 2020 e setembro de 2021 no Brasil.

Marcados pela discriminação

Numa terça-feira (31/01/2022), Milena Ravache foi impedida de utilizar o banheiro feminino durante ensaio na quadra da escola de samba Unidos do Viradouro, em Niterói, Região Metropolitana do Rio de Janeiro, por ser uma mulher trans. Após reclamações de Milena e amigos presentes, ela foi escoltada por seguranças para fora do local. “Cadê os direitos do nosso povo LGBTQIA+ ?”, disse Eduardo Mello, amigo de Milena que registrou toda a situação.

No mesmo período, em Santos, no litoral de SP, uma mulher trans foi impedida de usar banheiro feminino na lanchonete Surf Dog. Após a repercussão do caso, o dono do estabelecimento declarou: “não sou contra ninguém, graças a Deus, a pessoa pode ser o que for, ladrão, puta, viado, homem, branco, preto, todo mundo é ser humano”. Na justiça, a Surf Dog foi condenada a indenizar a cabeleireira em R$ 30 mil.

Em um shopping de Natal outra mulher trans foi impedida de usar banheiro feminino. Thabatta Pimenta, que foi eleita vereadora de Carnaúba dos Dantas em 2020, disse que foi o “o maior absurdo” e que os seguranças chegaram a questionar sobre a carteira de identidade dela. “Ainda fui questionada se o meu RG constava como mulher, ou seja, muitas violações”, relatou. “Não queremos que nenhuma outra pessoa trans seja violada desta forma, chega de discriminação”, desabafou Thabatta. No país do carnaval, banheiro neutro é uma luta da diversidade, contra a violência e em defesa da vida.

Memória é tudo

No dia 29 de janeiro, comemora-se o Dia da Visibilidade Trans, data instituída com o objetivo de aumentar a conscientização sobre a letra T da sigla LGBTQIA+, que representa os travestis, transexuais e transgêneras. Pessoas que não são doentes e muitos menos sofreram uma deformação, como disse o falecido político gaúcho da legalidade. É o dia de botar som na caixa, agitar as bandeiras da diversidade e reafirmar a luta pela liberdade de existir sem medo de ser feliz!

Edição: Comunicação SindBancários

Fontes: diários de SP, RJ e PE, ANTRA Brasil, Nuances, site SCRUFF, Agência Brasil, Blogs e coletivos de Diversidades, além de boletins produzidos por coletivos LGBTQIA+

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