Não pense que o ex-secretário do Tesouro Nacional dos dois governos Lula e do primeiro governo Dilma não tem preocupações e críticas sobre o atual rumo da política econômica do país. Não pense também que nas palavras do economista Arno Augustin haja qualquer ressentimento quanto à política que ele defendeu e aplicou de crescimento sustentável em um percurso de longo prazo no tempo em que foi secretário do tesouro nacional. É mais sugestivo pensar que, do alto de seu conhecimento dos números, da história de restrição do crescimento econômico e de sua experiência, Arno é uma autoridade naquilo que fala e que tem muito a contribuir para a manutenção de um país com visão de combate à desigualdade e de fomento ao crescimento econômico num período de longo prazo.
No segundo dia do primeiro módulo do projeto de formação dos delegados sindicais do Banrisul, Banco do Brasil, BRDE e Caixa, no auditório da Casa dos Bancários, na tarde da sexta-feira, 22/5, Arno Augustin chamou atenção para o contexto de virada na política econômica e para o papel que os bancários e seus sindicatos têm a desempenhar. É tempo de defender salários, conquistas e de pressão para a retomada de uma política de crescimento econômico que financie o combate à desigualdade e não rentistas (leia-se também banqueiros). Digamos que economia deva ser entendida, assim como o discurso de Arno, como algo que não se conhece na mídia, onde não há um diagnóstico preciso do que ocorre em tempos de ajuste fiscal, mas defesa de interesses de banqueiros e grandes empresários.
A atenção da luta dos trabalhadores, segundo Arno, deve ter como foco a taxa Selic. Desde 2013, o governo federal vem levantando sucessivamente o percentual de referência que determina como serão cobrados juros bancários e quanto o governo pagará como remuneração financeira para investidores pesados. Quer dizer, aumentar a taxa de juros significa reduzir o investimento público, remunerar melhor quem não investe em abertura de vagas de emprego e elevar o lucro dos bancos.
“O aumento da taxa de juros de curto prazo gera baixo crescimento. E nós entramos num círculo vicioso. O objetivo da Selic alta seria conter inflação, controlar os preços. Mas ela mexe também no câmbio e produz o efeito contrário que a mídia cobra do governo: ao reduzir o crescimento econômico, reduz a arrecadação e diminui o superávit primário. Quando se tem crescimento econômico, é fácil fazer superávit primário. Então, tem que reduzir a taxa de juros de curto prazo para o país continuar crescendo, porque os investidores financeiros e empresários deixam de investir em produção para aplicar em títulos do Tesouro que passa a ter uma rentabilidade alta e sem nenhum risco”, diz Arno.
Mas qual o efeito dessa política de cobrança e de resposta do governo de cumprir meta fiscal para aumentar superávit primário? Arno chama a atenção para o efeito do contexto político. Para um país em que historicamente a taxa de investimento é baixa, como é o caso do Brasil, o efeito de longo prazo de uma Selic alta é a recessão. Por isso que os banqueiros e a mídia sustentada pelos bancos passam a reverberar a necessidade de haver um ajuste fiscal e superávit primário. “Esse pessoal não fica feliz, apesar dos grandes lucros. Uma política de longo prazo de taxa Selic baixa tem a ver com um processo de libertação do país de investimentos de médio e longo prazos. E se não se libertar da taxa Selic nas alturas, fica difícil crescer”, diz ele.
Mas qual o papel dos trabalhadores? Arno sustenta que o contexto político atual, desde a eleição presidencial do ano passado, tem se caracterizado por pressões de vários grupos de interesse. Não por acaso grupos políticos financiados por banqueiros tem buscado reduzir direitos que, desde a CLT, em 1943, são garantidos. Neste contexto político-econômico, é possível compreender o motivo pelo qual deputados federais, 324 deles, votaram a favor do PL 4330, o da terceirização, em 8 de abril. “O modelo de economia neoliberal aplicado no Brasil nos anos 1990 era de remunerar o capital com uma taxa de juros altíssima (chegou a 40%). Essa política econômica reduz crescimento, reduz superávit primário e vem acompanhada de arrocho. A redução da renda média torna o país competitivo num período sebsequente e, de fato, gera crescimento econômico tendo como referência um período de crise. Mas a que custo? Ao custo do aumento da desigualdade”, diz Arno.
Entra então o papel do SindBancários e dos trabalhadores que lutam e conquistam com suas greves e pressão. Arno diz também que o sistema financeiro será o protagonista de uma espécie de divisor de águas para o futuro da política econômica governamental. É tempo de pressionar, de cobrar um papel mais social dos bancos públicos e a retomada de uma visão de crescimento econômico de longo prazo com investimento em renda e redução de taxa de juros. Voltar a crescer é possível e necessário.
“A participação de vocês (bancários) é importante. O centro do debate é o sistema financeiro. Esse momento pode decidir o futuro. As coisas se decidem em função da pressão. De um lado têm os jornais e do outro tem a luta sindical. A terceirização faz parte da mesma discussão. Há uma tentativa de virada nas condições de trabalho e redução do poder dos trabalhadores. É na pressão do movimento sindical que as coisas vão melhorar no Brasil”, acrescenta Arno.
Outra questão que Arno diz que é difícil de enfrentar refere-se ao que o governo federal tem feito em relação ao papel dos bancos públicos. Os bancos públicos chegaram, ao final de 2014, ao patamar de mais importantes agentes de investimento. Pense no programa Minha Casa Minha Vida da Caixa. Pense no crédito a juros mais baixos do mercado que o Banco do Brasil e o BNDES ofereceram para financiar obras estruturais e investimentos de longo prazo, como educação. Pense no papel do Banrisul como banco público. Pense que os bancos públicos respondem por 54% de todos os investimentos e que há 10 anos respondiam por pouco mais de um terço. Agora pense que os banqueiros de bancos internacionais e privados não gostam de perder um níquel sequer.
Pensou? Pois então pense que o Brasil está muito melhor do que já esteve. Que durante a crise financeira mundial do final de 2008 chegou a crescer 7,5% em 2010. Que o país não tinha reservas em 2002 e que agora as reservas internacionais batem em R$ 400 bilhões. Pense que o país deixou de ser devedor e passou a credor do FMI. Que a educação, fator de crescimento econômico sustentável, melhorou muito no Brasil. Pense que isso poderia continuar nos moldes de uma política econômica que gere demanda (crescimento) e não recessão, caminho diferente (e equivocado) para gerar superávit primário. Agora pense que precisamos lutar muito. “O país que queremos construir com competitividade é um país com redução de desigualdade. Não quero esse crescimento do salário baixo e do banqueiro feliz”, explica.
Fonte: Imprensa SindBancários